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Mães sociais do Bolshoi educam filhos “adotivos”

Mulheres são responsáveis por bolsistas que estudam na Companhia de Balé em Joinville

Edson Azevedo – edson.jve@hotmail.com

Você deixaria a família, os amigos e a cidade de origem para viver numa região com hábitos, costumes, sotaque, clima diferentes, e comandar uma casa com 10 adolescentes, 24 horas por dia, durante 10 meses ao ano? Foi o que fizeram a piauiense Maria do Socorro Nogueira da Cruz, 37 anos, e a paraibana Niedja Amorim de Andrade, 56 anos, as chamadas “mães sociais”. Elas são responsáveis pelos bolsistas que vieram do Piauí e da Paraíba para estudar na Escola do Teatro Bolshoi do Brasil, em Joinville, Santa Catarina (www.escolabolshoi.com.br).

Graças a convênios entre as prefeituras de Teresina e João Pessoa e os respectivos governos daqueles estados com a Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, 20 crianças tem oportunidade de estudar na mais conceituada escola de dança clássica fora da Rússia instalada no Brasil. Niedja Amorim (Paraíba) e Maria do Socorro (Piauí) foram selecionadas para acompanhar durante quatro anos esses alunos. Morando em casas mantidas através do convênio, elas são as responsáveis pelas crianças.

Instaladas em confortáveis residências localizadas no centro de Joinville, as pequenas “repúblicas” abrigam 10 crianças – meninos e meninas – com idade entre 13 e 16 anos. No período da manhã, as crianças freqüentam o Bolshoi e, a tarde, estudam em escolas da rede pública de ensino do município. Para garantir a bolsa de estudo, o aluno precisa ter boas notas na escola, além, é claro, bom comportamento.

Maria do Socorro Nogueira da Cruz, 37 anos, solteira, natural de São Miguel do Tapuio, cidade do interior do Piauí, pós-graduada em educação física, era professora da rede municipal de Teresina. “Eu morava com minhas duas irmãs e lecionava nas escolas da rede pública, quando fui convidada para acompanhar as crianças até Joinville (SC) para disputar vagas no Bolshoi”, conta Socorro, como gosta de ser chamada.

Estabelecer regras

Morando há 2 anos e 8 meses em Joinville (SC), numa casa próxima ao Joinville Tênis Clube, no centro da cidade, Socorro é responsável por cinco meninos e cinco meninas, todos naturais do Piauí. “Meu dia-a-dia é como o de uma dona de casa qualquer. Cuido da arrumação da casa, preparo as refeições e as roupas das crianças. Levo-as ao médico ou ao dentista quando é necessário. E também as acompanho nos momentos de lazer,” explica Socorro, ressaltando que as crianças têm que obedecer as regras estabelecidas por ela.

Socorro revela, no entanto, que a adaptação ao novo estilo de vida não foi fácil. “Nos primeiros meses as crianças estranharam bastante, pois sentiam muito a falta dos pais, dos irmãos, dos amigos e do estilo de vida que tinham em Teresina. Porém, com o passar do tempo, elas se enturmaram, fizeram novos amigos e conseguiram superar quase tudo”, conta a mãe social piauiense.

Há cinco anos em Joinville, a paraibana Niedja Amorim de Andrade, 56 anos, formada em Direito e mãe de três filhos, é a tutora de 10 crianças com idade entre 14 e 16 anos, todos filhos de famílias de João Pessoa. Funcionária aposentada da Secretaria municipal de Educação de João Pessoa, Niedja conta que ficou sabendo do processo seletivo quando ainda trabalhava na secretaria.

“A Secretaria de Educação estava procurando uma pessoa para acompanhar as crianças que iriam participar do processo seletivo do Bolshoi em Joinville. Quando parecia que tinham encontrado a pessoa certa, acontecia alguma coisa e a escolhida logo era descartada. Eu nem imaginava que seria indicada, pois não estava participando do processo seletivo para mãe social. Mas quando o secretário de Educação me telefonou dizendo que haviam encontrado a pessoa ideal, eu fiquei muito feliz. E foi aí a minha grande surpresa: a escolhida era eu”, conta, emocionada Niedja.

Adaptação difícil

Foi, então, que ela teve que decidir deixar tudo para trás – os pais, os irmãos, os dois filhos mais velhos casados, os amigos, a vida social em João Pessoa – e aceitar um novo desafio. “Se não fosse o apoio da minha família, eu não estaria em Joinville, revela a mãe social, ressaltando que os primeiros meses foram muito difíceis não só para ela e a filha caçula que a acompanha, mas principalmente para as crianças.

“As crianças sentiam falta das famílias, estranhavam o sotaque daqui, a alimentação, o clima, enfim, tudo. Foi um período muito difícil em nossas vidas”, conta Niedja. Hoje, mais adaptadas ao dia-a-dia e a rotina dos estudos, os bolsistas paraibanos só pensam em se formar e ser um bailarino famoso, reconhecido no Brasil ou até mesmo no exterior.

“O dia-a-dia tem que ser bem administrado, pois não é fácil lidar com 10 adolescentes ao mesmo tempo. Tenho que ter pulso firme nas minhas decisões, impondo regras para que tudo dê certo,” diz a mãe social, ressaltando que a convivência criou laços afetivos com as crianças. “Quando coloco de castigo alguma criança que desobedece as regras, fico com o coração partido. Mas tenho que fazer isso, pois é para o bem deles. Sei que mais tarde, quando forem adultos, irão lembrar e me agradecer por tudo isso”, finaliza a paraibana Niedja.

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